terça-feira, 6 de setembro de 2011

Qual a fruta do Desamor?

Se o maracujá é a fruit de la passion eu não sei. Nunca provei e desdenho ao declarar que deve ser uma paixão bastante sonolenta. Da maçã, a chamada fruta do amor eu entendo menos ainda, só como maçãs verdes e quando me arrisco na vermelha, elas sempre estão podres por dentro. Mas de desamor eu entendo e desvendarei um mistério nunca antes exposto. Começa com o Mundo das Bromélias se dividindo. Havia as úmidas, bonitinhas, insuportavelmente coloridinhas que eram sempre objetos de bromeliários. Mas havia também as bromélias selvagens. Grandes, espinhentas, insípidas e que cobriam solos agrestes. As bromélias rudes ficaram com inveja, ressentidas, amarguradas de nunca estarem em pedestais. Do fruto de seu orgulho ferido, nasceu o abacaxi. O abacaxi faz de um fruto, uma arma, seja pela coroa ou pelo pesado corpo espinhento. É mais arriscado ainda, pois nos pega por todos os lados. Olhar um abacaxi nos faz pensar: quem terá sido o primeiro homem a comer essa coisa tão alienígena. O cheiro do abacaxi é único e penetrante. Movidos pela inveja atroz, na tentativa de superar a beleza das bromélias boazinhas, ele se tornou maravilhosamente doce, com seu gosto exótico e inesquecível como o hálito do ser amado. O seu exterior é áspero e no topo carrega uma coroa de espinhos. Ah os homens bem sabem o significado de uma coroa de espinhos. Manejar um abacaxi deixa qualquer um desastrado. Descascar um abaxi, requer coragem. Enfrenta-se com lâminas afiadas um ser de couro grosso para chegar ao seu âmago que é uma surpresa doce como suponho que seja o amor. Então o abacaxi é o amor de dentro para fora. Um raio X do abacaxi mostra que para chegar ao amor, é preciso passar por lembranças duras e espinhentas, decepar coroas que ferem até atingir o amor. Quem amou um dia e muito sofreu é coroado como o abacaxi. Mas ele é uma coisa blindada pela natureza. De fora para dentro ele é a concepção do Desamor. Grosseiro, espinhento e perigoso. Todos os dias um abacaxi passa pela minha garganta, e não é fatiado. Eu engulo a realidade pura, através da revolta invejosa das bromélias rudes. Todos os dias eu engulo o meu próprio Desamor.
(Hordália das Dores Ferreira)








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